13 de junho de 2005

Onde estão as barcas? Onde são as ilhas?

Passamos pelas coisas sem as ver,
gastos, como animais envelhecidos:
se alguém chama por nós não respondemos,
se alguém nos pede amor não estremecemos,
como frutos de sombra sem sabor,
vamos caindo ao chão, apodrecidos

Também eu, génio, te quis matar. Tal como todos os poetas que conheço.
Porque andaste uma vida a encher as palavras de sal, a espremê-las com as mãos, sempre rente ao mar, na urgência do pólen que te brotava do peito...
Porque inclinaste as noites e partiste os dias um a um, e de palavra em palavra deste às romãs a cor do lume...
Porque inventaste o riso breve, desbravaste a síncopa dos peixes verdes e o contratempo do adeus...
Porque sempre me avisaste que irias com as aves...

Agora só me resta beber-te a sede.

6 comentários:

Anónimo disse...

Foi ave, foi onda, foi espuma, folha, luz.
E sabia: nem a morte.
Que mais tendes na manga? Hem?

Anónimo disse...

"Música, levai-me ...

...No brilho redondo."

Tristo-me de olhos fortes
e de alma chorada.

Fico-lhe egoistamente com letras repartidas pelos meus estilhaços reluzentes.

Morna

HFR disse...

Muito bonita a homenagem, amigo das aves, também. Abraço do helder.

Anónimo disse...

Morreu Álvaro Gonçalves Andrade.
Junho, mês fértil.

D.

Anónimo disse...

Do mar li gotículas e banhei-me nelas em aplausos eternos...
O Belo continua a coexistir!...

Anónimo disse...

As Amoras ( E.A.)

O meu país sabe as amoras bravas
no verão.
Ninguém ignora que não é grande,
nem inteligente, nem elegante o meu país,
mas tem esta voz doce
de quem acorda cedo para cantar nas silvas.
Raramente falei do meu país, talvez
nem goste dele, mas quando um amigo
me traz amoras bravas
os seus muros parecem-me brancos,
reparo que também no meu país o céu é azul.

Eugénio de Andrade ("O Outro Nome da Terra")

espiral azul