26 de junho de 2009

In dubio... pronúncia


O professor criticava, na ausência da própria, uma aluna em termos exageradamente sarcásticos, apenas porque tinha pronunciado Curriculum Vitae como "currículum vite" e não como "currículum vitái", como ele achava correcto. Eu não tenho idade suficiente para alguma vez ter ouvido falar latim pelos genuínos falantes, mas lembrava-me de ter lido algures sobre uma espécie de convenção dos latinistas sobre fonética do latim e sobre as diferenças entre o latim clássico e o latim restaurado, pelo que logo ali fiquei com imensas dúvidas sobre as certezas daquele professor. Parece que também cada língua adopta a sua fonética (por exemplo, o termo latino media dizia-se média em português e cada vez se adopta mais a pronúncia - e até a grafia - mídia, porque é assim que os ingleses lêem). Mas, como costumava ouvir a um amigo meu, milium primum pardalorum est, deixei-me ficar com o ninho atrás da orelha e, logo que pude, fui tentar esclarecer a coisa.
Pois até dizem que é uma espécie de despautério (termo que vem do latim e significa grande asneira ou verdadeiro disparate).

De acordo com a pronúncia tradicional, curriculum vitae pronuncia-se currículum víte, e é esta que deve preferir-se. Pretender impor a articulação vítai (ou mesmo wítai), de acordo com a pronúncia restaurada, parece-me um exagero ou mesmo um pretensiosismo tão grande como seria exigir que se pronunciasse etc. (et cetera) da mesma forma que os romanos do tempo de Cícero: et kétera…
Também é de evitar a prolação vitái, como às vezes se ouve por aí, pois essa nem é tradicional nem clássica. É apenas um despautério…



A minha amiga Xantipa que trata gregos e romanos por tu é que certamente sabe e ainda lhe hei-de perguntar das suas razões.
O latim é uma língua morta e não dará voltas no túmulo se a gente não a pronunciar bem. Portanto para mim estão empatados, ou seja, ex-aequo ( aquele prof dirá ,seguramente, egzaikuo) e tanto faz. Até estou em crer que os latinos nortenhos pronunciariam, de certeza, currículom bite, carago!


Desde que ouvi uma vez um jornalista dizer que um determinado acontecimento tinha sido adiado "sáine dáie", já acho que tudo é possível.

23 de junho de 2009

Pedalanço






Andar de bicicleta na ponte é uma experiência extraordinária. Poder parar, olhar o Tejo, admirar a cidade, as duas margens, observar os mariscadores, as aves... Beijar a meio do tabuleiro da ponte faria o Vasco da Gama arregalar os olhos e cofiar a longa barba. Esta experiência vale os 60 euros e o levantar cedo.


O resto, não. A qualidade das bicicletas (talvez porque montadas à pressa e mal afinadas), a ausência de mais apoio técnico ao longo do percurso, quando as bicicletas se começam a desconjuntar, a intoxicação publicitária e o inenarrável speaker.


A iniciativa é interessante, tem o apoio do IDT, cuja mensagem se perde completamente. É pena que não prevaleça uma associação mais forte a uma ideia de vida saúdável, de respeito pela natureza, de sustentabilidade ambiental.


O que vale é que a gente com quem me cruzei nesta manhã parece não ligar patavina às marcas patrocinadoras e lá vai bem disposta e partilhando o prazer desta aventura. A mochila diz galp, mas a gente a seguir vai é abastecer ao jumbo e pronto.

Ai, um beijo na ponte...

Pedala que ped'alma (desculpa lá esta O'Neil)

20 de junho de 2009

Solestício

Previsões para amanhã:
Onda de calor na Amareleja e Bike Tour na ponte.

10 de junho de 2009

Ainda as europeias

Estive para titular este post como O ovo da serpente, o célebre filme de Bergam de 1977, sobre os sinais promonitórios do nazismo na Alemanha do pós-I Guerra Mundial. Só não o fiz porque ao pesquisar sobre o filme o Google devolveu-me, entre imensas outras alusões e títulos, um do Miguel Portas, muito recente e um outro mais antigo do "abominável César das Neves" e perdi a vontade a essa metáfora.
Ainda assim, e porque isto anda tudo ligado, mesmo que às vezes não entenda muito bem a cosa.
Ah, hoje era sobre as eleições para o parlamento europeu que decorreram no domingo. Decorreram bem, sim senhor, porque o presidente Cavaco em boa hora veio uns dias antes lembrar os portugueses que deveria estar bom tempo (ao contrário do que anunciava a meteorologia) e que na semana a seguir havia dois feriados seguidos e, embora não tivesse sugerido propriamente que dois ou três dias por conta do período de férias teriam um efeito multiplicador, os portugueses entenderam muito bem e aproveitaram a dica. O resto também ajudou. Europa? Ainda se fosse o europeu de futebol!...
Mas o que eu queria aqui deixar registado era outra coisa. Na noite eleitoral, já depois de se saber que o PSD tinha mais votos e o lipidinoso Rangel destilava vingança misturada com o que aprecia ser um programa político para o país, pondo-se em bicos de pés como se tivesse vencido as legislativas, impressionou-me a moldura juvenil que o cercava. De repente tive a sensação de já ter visto aquilo. As mesmas caras de parvo, as mesmas camisas às riscas metidas em calcinha bege de algodão... Estes jovens betinhos são os filhos dos betinhos da AD dos anos 80! Só têm de diferente aquelas lenga-lengas que caracterizam os (outros) hooligans da bola.
Quem viveu esse tempo reconhece os sinais.

2 de junho de 2009

As bestas, novamente

Imagem apanhada aqui


Há dias ouvi por aí nas notícias que alguém da igreja do vaticano teria dito algo como: o aborto é muito mais grave que os abusos sexuais de menores. Não tinha percebido bem o contexto em que tão absurda declaração era emitida, mas fiquei, até hoje, com a pulga atrás da orelha e fui procurar. Estes vermes de sotaina não fazem por menos: em meia dúzia de palavras querem branquear décadas de pedofilia nos colégios católicos irlandeses e combater o projecto de lei do governo espanhol sobre o aborto.


A besta chama-se António Cañizares Llovera e é cardeal. Mas podia ser qualquer um das centenas que ao longo dos anos abusaram de crianças que era suposto proteger, barraram investigações, sonegaram informação, queimaram relatórios, esconderam criminosos, durante muitos anos e em diversos países do mundo.
Daqui a muitos anos há-de vir aí um papa qualquer coisa XXVII pedir perdão ao mundo sobre estes pecados, mas isso não muda a vida das vítimas de abuso que continuam expostos a estes predadores.
É preciso dizer-lhes na cara que o abuso pedófilo é crime. E que, nas circunstâncias em que é perpetrado pelos membros da igreja católica, devia ser considerado crime contra a humanidade. As vítimas são frequentemente crianças já em estado de necessidade, ou aquelas cujas famílias as confiam a uma instituição que respeitam para lhes proporcionar o que julgam ser uma melhor educação.

Revolta-me que esta gente untuosa ande por aí impune e ainda tenha o desplante de vomitar estas baboseiras. Ao menos calem-se. Se quiserem, rezem. De preferência baixinho.