24 de abril de 2011

Do amor



Do amor diz-se tanta coisa. Que é cego e arde. E cura dói. Que é doce e aperta o coração. Que é doido e isso é paixão. Eu sei lá o que é o amor.
E assim sem teoremas. Numa visão incompleta e interesseira. (Não me peçam para ser imparcial no amor). O amor é um estado de necessidade.
É a falta que me fazes e a urgência de me teres.

Outro video aqui.

21 de abril de 2011

A carroça



A nossa comunicação social adora o repet mode. Diria até que veneram o lugar comum e a frase feita e a formulação discursiva automática. E oca. Não sei em donde isto vem, mas admito que poderá ser influência de alguma liturgia à mistura com futebolês. A cada dois minutos de notícias pode sair, sete vezes repetido, o vocábulo troika. Escrevo assim com k, embora a grafia portuguesa acordada consigne a forma troica, para manter a proximidade ao seu significado original. A palavra em russo significa trenó grande puxado por três cavalos. Cá não se usa disso. Os veículos de tracção animal (devo estar a citar o João Catatau das lições de código) por cá têm rodas que é um dispositivo redondo inventado muito antes do FMI e são puxados geralmente por seres chamados bestas. Há também os carros puxados por uma junta de bois, mas esses são muito lentos e fazem uma bucólica chiadeira. Depois há, carroças, galeras com fueiros e sem fueiros. Nas versões urbanas, e sempre puxadas por cavalos, podemos recordar o barouche, a caleche, a biga (em italiano biga mia), a charrete, a carruagem, o coche e por aí fora. Havia quem andasse na berlinda e a coisa com nome mais longíquo que por cá apareceu terá sido a britzka e uma coisa que não sei o nome mas que foi logo baptizado de carro americano que andava sobre carris puxado por cavalos e antecedeu os carros eléctricos.
A história não reza, mas é possível que ainda antes da haver Portugal tenha cá vindo uma delegação de Roma cobrar impostos a este povo que, diziam, nem se governava , nem deixava governar. Nessa altura, os arautos iam de terra em terra e deviam anunciar a vinda da quadriga, que era o carro muito na moda em toda a Roma antiga. Agora temos troika, não rola, desliza, mas precisa de neve.
Como é possível mandar uma troika para Portugal onde praticamente não neva e muito menos no Terreiro do Paço?
As notícias não dizem, mas vê-se pela cara deles quando são filmados à saída do ministério das finanças, que os senhores estão muito angustiados e parece que até já pediram apoio psicológico. O contacto com a situação portuguesa não é fácil, mesmo para pessoas habituadas a lidar com a frieza dos números. Quando viram o valor real dos salários mais baixos e das pensões miseráveis e o compararam com os rendimentos mais elevados começaram a ficar agastados. Quando os diligentes técnicos do ministério lhes disseram que a ideia era dar mais uns cortes, sentaram-se e pediram um copo de água. Parece que estiveram quase a chamar o INEM, mas contiveram-se para que eles não julgassem que vivemos no luxo.
Até tinha a sua graça. A troika ia de padiola.

11 de abril de 2011

Da lógica da batata à coerência da salsicha


Devo começar por dizer que não gosto nada do que vou fazer. Acho de muito mau gosto trocadilhar assim com o nome das pessoas, mas às vezes não resisto. A coisa até nem é muito grave, porque apesar de tudo o nome em questão até parece fornecer alguma blindagem que não sei se o nomeado merece. Aos críticos destas brincadeiras, peço alguma tolerância, pois. Também, caramba, não venho aqui pedir que a Zita Seabra...

Vamos então ao que interessa.

Nas últimas presidenciais estive bastante à rasca e se não fosse o facilitar a percentagem ao Cavaco, nem me teria dado ao trabalho de votar por falta de candidato. No final lá me decidi a votar no único candidato sério que apareceu. Aquele que assumiu a pantominice e a descontrução deste processo. O Coelho da Madeira, qual bicho carpinteiro, não construindo propriamente uma alternativa, talvez tivesse mostrado as fragilidades e overdadeiro caruncho do pau de que é feita toda esta santidade política.

O Nobre apresentou-se como representante da "sociedade civil" e isso em princípio seria um valor. Aparentemente. Porque na sua órbita deixavam-se ver algumas personalidades que, sem qualquer menosprezo pelo trabalho social que fazem, se orientam por uma lógica de dependência do Estado e de alguma chafurdice política pelos gabinetes ministeriais, sejam eles tutelados por quem for. É, de certa forma, esta a "sociedade civil" organizada em lobby e carente de um representante a que mais se galvanizou para apoiar Nobre à presidência. E muita gente, que se não revê nos partidos e nos candidatos partidários "independentes" acreditou que, finalmente havia alguém suficientemente reconhecido capaz de incarnar essa alternativa e fazer disso um projecto ganhador. De ganhar aos partidos, para ver se eles aprendem a ser melhores. A ideia não é má, mas a mim bastou-me um dia ver na televisão a sua comunicação sem som, para ter o sentimento de que havia ali algo que me fazia desconfiar. Acho que não votei nele por isso.

Agora sabemos que aceitou ser candidato do PSD. E que se o PSD ganhar (o que ainda não é líquido) Nobre será presidente da AR, segunda figura do Estado.

Por mim, até pode ser. Mas não deixo de me interrogar sobre a natureza das coisas com que se faz a política. Se os portugueses elegem figuras destas para seus representantes, de que é que se queixam?


A ascenção política é uma máquina com um processamento interno muito complexo e frequentemente inacessível, mas no essencial é muito simples: por um lado entram porcos inteiros e, pelo outro, saem salsichas prontas a consumir.

5 de abril de 2011

Havia do Infante e agora há Vinte e Dois



Eu sei que há muita boa gente que acha que se queremos andar na autoestrada devemos pagar portagens e que o que deve vigorar é um princípio inventado com um fim obscuro, em princípio inventado por alguém que ninguém sabe quem é, mas presume-se que certamente amigo do povo trabalhador e dos mais desfavorecidos que nem carro têm e que por isso nada t~em que pagar para outros se delocarem em duas faixas e a 120 km/h. E logo chamaram a esta teoria «o princípio do utilizador-pagador», o que até não está mal se o compararmos com outro «princípio» em uso em muitas circunstâncias que é o princípio (assim por mim baptizado, para que conste) do «pagador-pagador». Aqui o pagador paga, mas não utiliza, o que faz com que este princípio atinja um fim muito mais principalmente do que o outro. Eu dou alguns exemplos. Através de vários impostos, taxas, sobretaxas, mais impostos aplicados até às próprias taxas associadas ao meu modesto automóvel e ao combustível seria suposto pagar uma rede viária para poder circular, mas se não tenho uma alternativa decente e necessito mesmo, lá terei que pagar (aqui até poderíamos falar de uma extensão do princípio que passaria a ser «pagador-pagador-utilizador»). Outro exemplo: tenho televisão por cabo que pago (juntamente com serviço de internet e telefone) e aqui vigora o princípio «utlilizador-pagador» porque utilizo e depois pago de acordo com um contrato (sempre mais ou menos manhoso, mas vá...) , mas a coisa não é bem assim e na realidade o princípio é o de «pagador-utilizador-pagador» porque todos os meses pago a televisão que utilizo ao meu fornecedor de cabo e, também ao Estado através da taxa de radiodifusão sobre a qual ainda é aplicado o IVA (sempre gostava que me explicasem qual é o valor acrescentado desta taxa) pagando assim duas vezes o mesmo serviço.


Pois que fique bem claro que eu não sou bem contra as portagens (até posso ser porque esse é um negócio que alguém faz com empresas privadas e até com alguma participação do Estado e que em última análise é sempre ruinoso para os contribuintes); eu só é a favor de vias decentes para nos deslocarmos em situações normais, coisa que todos pagamos para utilização comum. Invocar que «o país» não pode suportar isso é branquear a incompetência e, pior ainda, a corrupção que campeia entre o Estado e meia dúzia de grandes empresas que dominam estes negócios e que depois asseguram bons lugares a ex-ministros.


Tenho ouvido e lido alguns argumentos que pretendem classificar as populações desta ou daquela região de não quererem pagar portagens e que isso é uma injustiça porque outros também pagam e etc. Acho uma palermice e seguir esse raciocínio para outras áreas leva-nos para terrenos muito perigosos onde nem se poderá falar sequer de justiça.


Não defendo qualquer medida de excepção para os residentes. Onde não há alternativas, não se deve pagar porque isso é simplesmente uma extorsão. Concordo em pagar um serviço extra, de qualidade melhorada que me permita avaliar a opção face ao custo-benefício. Não devemos pagar, aqui ou noutra área qualquer, nesta região ou noutra, o serviço que nos é devido porque o pagamos.