27 de novembro de 2009

Sotaina oculta

As notícias trouxeram à luz o que já se sabia há vários anos. Os altos responsáveis da igreja católica da Irlanda ocultaram continuados abusos sexuais de padres a crianças de quem deviam cuidar. A recorrência com que esta gente "temente a deus" tem perpetrado impunemente estes crimes, dá que pensar. Serão os seminários verdadeiras escolas de pedofilia?
Mas o que me inquieta mais é a ocultação sistemática dos mais altos responsáveis da igreja católica, Vaticano incluído. Já aconteceu em larga escala há anos nos Estados Unidos e concluiu-se que havia relatórios retidos, desaparecidos e alterados, ao que parece com a própria conivência papal com um crime hediondo.
Se isto acontecesse numa outra organização qualquer não haveria dúvidas de que estávamos perante uma associação criminosa. Alguém ousa pensar isso da igreja católica?
Não me venham dizer que sou intolerante. Uma organização que pactua com a pedofilia e protege os predadores sexuais é que é intolerável.

15 de novembro de 2009

Teorias (II)


Há dias, no meio de um texto tropecei nuns gravetos de uma teoria com um nome intrigante. Assim, apenas pelo seu nome bootstrap theory pouco se fica a saber, e bem tentei capturar o significado da expressão e tentar arranjar uma equivalente em português. Em vão. Apenas consegui dar mais umas marteladas na autoestima e acrescentar mais uns quilómetros ao infinito da minha ignorância. Mas, pronto, isto tem sempre um lado positivo ( a gente tem que sobreviver de qualquer modo à depressão súbita) e tomei consciência de quão ignorante sou em matéria de física quântica, sistemas informáticos, estatística, filosofia, sociologia, economia, e até (vejam bem) em estratégias para vencer na vida.

Pelo que li e vi e pensei (sem ser necessariamente por esta ordem ou outra qualquer) o termo bootsrap presta-se às mais diversas metáforas. Bootstrap é (num dos muitos significados) o nome daquela espécie de argola em couro que algumas botas têm e que serve para enfiar o dedo, puxar e ajudar a calçar. Em português também tem um nome. Chama-se aselha, uma pequesa asa. Aselha é também o que na gíria se chama a um indivíduo parco de habilidades, enrascado, labrego, totó. Quanto à teoria, fazendo uma síntese de toda esta profícua investigação acho que ficaria bem, até do ponto vista cultural, como teoria do desenrasca.

Não sei. Talvez até seja bem mais aselha do que penso. Mas há-de haver alguma explicação para o facto de um taxista na Suíça ter contas bancárias milionárias e um negociante de sucata oferecer mercedes pelo natal aos amigos.





12 de novembro de 2009

Em Bragança não há gaivotas

Por acaso jantava uma alheira. A televisão ligada já tinha mostrado todas as faces mais ou menos ocultas dos corruptos aos magistrados e futeboleiros. Parece que há sempre algo oculto nas faces das notícias, mas às vezes também se descobrem faces iluminadas na sua simplicidade.
Na SIC, passava um conjunto de reportagens chamado "Histórias com gente dentro". Aí cruzavam-se vidas de pessoas simples como os turistas séniores que vão nas excursões por animadas por pezinhos de dança, ou como a mulher do carroussel de feira a quem já só faltava ir à lua. Quase não tinha ido à escola, mas tinha aprendido o suficiente para a sua vida de feiras. E também uma pastora transmontana que tratava as suas ovelhas pelo nome, Boneca, Galinha, Sineta... e elas vinham lamber-lhe as mãos como se fosse um cumprimento habitual. Esta pastora tem 29 anos e nunca tinha visto o mar, nem andado de comboio ou ido a Lisboa. O programa proporcionou-lhe essa viagem. No seu encontro com o mar, que só conhecia pela televisão, às tantas pergunta Aquilo é uma gaivota? Em Bragança não há gaivotas...
Pois, parece que não. Há águias e sonhos.


Fui à SIC Online e trago de lá um link para outras estórias de saltar muros. Se calhar vai dar à rua dos 90.

5 de novembro de 2009

Cruzes

Daqui a nada também vão querer eliminar o sinal "+" em Matemática, porque é uma cruz que pode ofender os das religiões que não têm cruz nenhuma.
Ironia (fica-lhe bem) do porta-voz da Conferência Episcopal- Manuel Marujão

Ainda mal assentou a poeira da bíblia segundo Saramago e já outra maior se alevanta: a reacção dos funcionários do Vaticano à ordem de retirada dos símbolos religiosos das salas de aula nas escolas públicas.
Devo dizer que andei numa escola pública que tinha um crucifixo entre uma fotografia de Oliveira Salazar e outra de Américo Thomaz e tinha a visita semanal do padre Octávio que vinha dar Moral e Religião, disciplina obrigatória, com livro próprio e tudo, vendido pelo próprio padre.
Deu no que deu. Para além de começar desde cedo a trocadilhar o nome à disciplina para ReligiãoImoral, recusar-me a comprar o livro (e apanhar depois uns chapadões de deixar a cara a arder durante meia hora quando a minha mãe foi chamada à escola), acabou por fazer de mim ateu, praticante e anticlerical.
Acho graça ao discurso dos padres quando se lhes toca no que julgam ser os seus domínios, mas que na realidade são domínios públicos num estado de direito, não confessional. Não me conformo com a arrogância com que tratam "as ovelhas tresmalhadas" como se os não crentes sofressem de qualquer deficiência. Não aceito a invocação da liberdade religiosa da parte de quem sempre abusou de toda a liberdade cívica para impor a toda uma sociedade os seus princípios, geralmente restritivos da liberdade e da autodeterminação.
Também não deixa de ser interessante, para uma organização que não se deixa questionar sobre práticas criminosas com as quais convive e muito pactua (os inúmeros casos de abuso sexual de menores por parte de membros da igreja) venha agora a correr dizer que é preciso discutir mais e amplamente a questão do casamento entre pessoas do mesmo sexo. É preciso explicar a esses senhores que não é para obrigar ninguém a fazê-lo; é só uma pequena alteração na lei de modo a permitir a quem o queira que o faça.
Outra originalidade do argmento da "liberdade religiosa" destes senhores é que "uma minoria" (os não católicos ou os não crentes) não pode dizer à "maioria" como é que é. Ficamos esclarecidos sobre tolerância e liberdade.
Quero deixar claro que as minhas posições não são ditadas por intolerância religiosa. Respeito que cada um possa acreditar ou não acreditar que existe um deus ou mais. Até sou capaz de usar ideias mais ou menos místicas, do ponto de vista simbólico ou poético. O que eu não consigo tolerar é a intolerância e, sem generalizações abusivas, há, não raramente da parte de membros da igreja católica traços de intolerância que, para mim estão ao mesmo nível do racismo, da xenofobia, do fascismo. Causam-me a mesma repulsa.

Mas não quero deixar de responder à ironia de Manuel Marujão, mas desta vez em relação aos argumentos culturais e das tradições. É que Portugal é, também um país de grandes tradições de uma cultura popular (às vezes bastante brejeira) e até nos podemos pôr todos de acordo. A igreja pode ter os crucifixos nas escolas e até se pode pôr ao lado o emblema do benfica e, em contrapartida as igrejas passam a ostentar em lugar de destaque uma figura do Zé Povinho do Bordalo e, se não for pedir muito, um daqueles objectos decorativos da cerâmica tradicional das Caldas. Isso sim, é que era liberdade e tolerância religiosa.

4 de novembro de 2009

Teorias (I)

É sabido que as principais doenças dos nossos tempos, as que mais matam e mais incapacitam, seriam de certo modo evitáveis, ou sofreriam uma grande diminuição se estivéssemos dispostos a alterar os nossos hábitos em várias áreas da nossa vida. São chamadas doenças «da civilização» e também «do comportamento». Todos os anos são gastos rios de dinheiro em campanhas de efeito duvidoso para que as pessoas alterem os seus comportamentos. Faça exercício físico. Mantenha a actividade intelectual. Coma fruta. Na hora da refeição, desligue a televisão. Reduza a carne na alimentação. Atravesse na passadeira. Reduza, reutilize, recicle. Vigie a sua tensão arterial. Não fume, não beba e perca peso. Tudo prescrições sem graça nenhuma e sem qualquer interesse motivador imediato, excepção feita ao slogan do meu amigo Dinis uma por dia e nem sabes o bem que te fazia.
Mas parece que alguém se lembrou já de arranjar formas divertidas para promover alterações nos seus comportamentos. Chamam a isto Fun Theory.
Vejam este exemplo e comecem já a pensar noutros. Também aqui, imaginação é poder.

2 de novembro de 2009

Cinéma



Fui ver os dois últimos filmes da festa do cinema francês. Dois, assim de seguida.
Mas não é a mesma coisa...
Sempre gostei do cinema francês que infelizmente passa pouco no circuito comercial das pipocas. Aprendi a ver cinema em francês. Como gosto da língua, habituei-me a quase não ler as legendas e ver muito mais filme.
Mais ce n'est pas comme d'habitude...
Um bom filme é muito melhor de mão dada e, mesmo quando somos capazes de perder uma ou outra cena do ecran, se calhar ganhamos a melhor parte do filme.
É que... um filme é quase sempre feito de vários filmes e parte-se em partes e apura-se em remakes.
Mas isso é mais quando estamos acompanhados no escuro, de mãos dadas e sentimos as vibrações um do outro e os olhos molhados quando calha.
Sozinho, é mesmo outra coisa.
Saudades, é o que é.