16 de janeiro de 2009

Em nome do quê?

Seguindo um pouco algumas ideias daqui e outras dali e talvez dacolá, vêm-me às vezes razões para um proselitismo ateu, se é que essa coisa existe. Provavelmente, não, mas não me parece que seja impeditivo de nada.


Não tenho nada contra quem acredita num deus ou em vários deuses, desde que o façam na esfera privada ou no interior da sua comunidade de crentes. Sempre que isso se torna público e é trazido para a vida social e política sou contra. Quando isso acontece, causa-me sempre alguma brotoeja. Até parece que é suposto que eu, não crente, tenho obrigação de estar a par das conversas que cada um tem com o seu deus e, sobretudo que terei escutado o que deus lhes disse. Nas suas cabecinhas crentes está embutida a ideia de que o seu deus é universal e que portanto fala para todos e que todos ouvem e se há uns que não ligam ou não acredita é porque têm uma deficiência neuronal na área da fé. Enfim, também tenho direito aos meus delírios.


Se a fé, a crença num deus salvador, justiceiro, bom, mau ou como calha, se reservar ao âmbito privado, parece que não vem mal nenhum ao mundo. Pelo contrário, quando uns se armam em iluminados de uma capacidade, conferida e legitimada apenas pela sua fé, de atribuir a outros uma classificação (inclusiva ou exclusiva) que no limite pode acabar numa guerra a matarem-se uns ao outros, há aqui alguma coisa que não está bem e eu não consigo ficar indiferente e respeitador da "liberdade religiosa". Se pensarmos que acontecem guerras em nome de um deus que ainda por cima dizem ser único e o mesmo para todos, não sei mesmo que nome dar a isto. Estou indeciso entre procurar aqui ou aqui.


Já me têm chamado intolerante e arrogante perante a fé dos outros por ter esta posição de confronto. Costumo responder que o facto de não acreditar na existência de um deus não condena ninguém à fogueira, ao apedrejamento, ao ostracismo e por aí fora. Não há conhecimento de que um ideal ateu tenha dado origem a uma "guerra santa", "jihad", ou "cruzada" em que uma parte da humanidade quer eliminar outra parte a quem designa reciprocamente como infiel, apenas porque, ou não acredita em deus, ou, acreditando, acredita de forma ligeiramente diferente.


Se deus existisse, já teria posto cobro a isto. mas deus, dizem, concedeu aos homens o "livre arbítrio". Então está bem. Podem matar-se uns aos outros em seu nome.





Há dias recebi por mail um video em que Obama fala sobre tolerância religiosa. Vinha legendado em português, não tinha som e era uma nítida colagem de partes embora aparentemente do mesmo momento. Duvidei da sua autenticidade e fui pesquisar. Esse discurso existiu mesmo e terá ocorrido em Junho de 2008 e logo no início diz assim:


Whatever we once were, we're no longer just a christian nation; we are also a jewish nation, a muslim nation, a buddhist nation, a hindu nation and a nation of non-believers...



Não consegui a transcrição integral, mas do que me lembro da legendagem em português é bem interessante. Também li nessas pesquisas que este discurso causou bastante polémica no seio dos meios católicos e evangélicos mais conservadores, acusando-o de pôr em causa a herança cristã e fundadora da América (também todos sabemos do valor dessas heranças em sangue) e o tom é de tal modo ameaçador que não me admiraria que um dia destes Obama sofra um atentado com essa motivação. Tudo em nome de deus, claro.

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