19 de abril de 2005

Arte de voar

Aetas: carpe diem,
quam minimum credula postero

(Odes, I, 11 – Horatius)

Fechei por um momento os olhos e recordei aquele sonho em que teimavas que eu aprenderia a voar contigo. Eu, temendo desiludir-te, ia-me esquivando, mas tu insistias e abrias argumentos em leque com que abanavas as minhas hesitações.
Não consegui, finalmente, resistir ao argumento sagital. Era porque querias muito.
E lá me explicaste como deveria fazer e, sobretudo, para não ter medo, porque só isso me poderia fazer cair. E assim foi. Elogiaste o meu voo e brincámos com aquela estória do Luís Sepúlveda de pôr um gato a ensinar uma gaivota a voar...
Achei que não ficaste muito satisfeita quando comecei a sugerir algumas correcções para melhorar a técnica.
Desculpa. É a minha natureza...

7 de abril de 2005

Abrílogo

Estas VTIC são uma maravilha. Eu explico: VTIC significa velhas tecnologias de informação e comunicação. E refiro-me em particular à MB (message in a bottle) ou em português MG que se lança ao mar depois de se pensar com alguma intensidade na força e orientação das correntes marítimas e também dos ventos e outras energias. As principais características deste meio de comunicação são a lentidão, a incerteza sobre o destino e o destinatário e a impossibilidade de retorno. E isto faz toda a diferença relativamente a outros meios! Mas não é disso que vou falar.
Hoje o mar devolveu-me uma garrafa com uma mensagem dentro. Quando a abri, reconheci-a e lembrei-me de a ter lido e lançado novamente ao mar, num qualquer Abril. Voltou a mim passado algum tempo. Sei que foi lida e reencaminhada muitas vezes (vinha cheia de FWs acrescentados ao original).
Vou estendê-la aqui a secar.


Há muitos anos, era a liberdade ainda pequena...
Eu também era um menino. E saltava pelas janelas

dos meus cadernos escolares e saía a correr
pelas portas que abria em cada livro.
As viagens que eu fazia!
A liberdade-menina

era uma fotografia na parede do meu quarto
e tinha uns olhos bonitos
que me seguiam.
Às vezes até me escondia e olhava de repente

a ver se ela estava distraída...
Mas nunca a apanhei em falta. Acho que era por gostar de mim...
Era a minha namorada!
Um dia acordei e vi que ela tinha crescido tanto

que já não cabia no meu quarto
e escorria pelas ruas
e dançava com toda a gente
e deixava-se beijar...
Não, nunca tive ciúmes!
Aquela que eu amava quase em silêncio

podia ser amada de todos
à luz do dia!
E vestiram-na de bandeiras
(ela que sempre se quis nua)

e foi momo de carnaval.
Embrulharam-na em editais,decretos e alvarás

e até as finanças lhe quiseram cobrar impostos.
Mas a minha amiga liberdade,

discretamente,
rasgou todos os cartões
e cartas de alforria,
e passou a andar por aí.
Disso tudo,

conservou um cravo no cabelo
que lhe fica tão bem.

Saímos muitas vezes juntos;

fazemos caretas às chatices
e escrevemos na areia da praia
em letras bem grandes o nosso caderno reivindicativo.

Ah! Temos uma coisa íntima
que tomo a liberdade de revelar:
Fazemos amor sempre que nos apetece!

Amamo-nos sempre!

3 de abril de 2005

Abri-lo!

Era uma vez um país
onde entre o mar e a guerra
vivia o mais feliz
dos povos à beira-terra
José Carlos Ary dos Santos

Voltei para abrir de par em par as portas do mar de Abril.
E logo me embebedei de maresia que andava à solta pela praia.
Depois, embalei-me de contradições e outros sonhos meridianos
.