31 de maio de 2006

Canto

EPÍGRAFE
De palavras não sei. Apenas tento
desvendar o seu lento movimento
quando passam ao longo do que invento
como pre-feitos blocos de cimento.


De palavras não sei. Apenas quero
retomar-lhes o peso a consistência
e com elas erguer a fogo e ferro
um palácio de força e resistência.


De palavras não sei. Por isso canto
em cada uma apenas outro tanto
do que sinto por dentro quando as digo.


Palavra que me lavra. Alfaia escrava.
De mim próprio matéria bruta e brava
- expressão da multidão que está comigo.


José Carlos Ary dos Santos


Hoje acordei a cantar Um canto redondo e sem palavras Apenas um silêncio sábio no compasso da distância onde todas as aproximações são possíveis
O mundo espera E há uma palavra madrugada salvadora atada e cega na garganta

28 de maio de 2006

Pelasta maailma

Na ausência total de qualquer explicação,
somos o testemunho involuntário da encenação de uma
série de crimes
Joaquim Pessoa. Vou-me embora de mim

Bem que eu sonhava em salvar o mundo Este mundo inquinado de gente que já o quis salvar E já só acredito nas minhas utopias tal como outros acreditam em deus E no ginseng E nos bífidos activos E na selecção (ia dizer natural mas já só há fresca e com sabores) nacional Vou continuar a acreditar Sei que não salva o mundo É apenas uma forma de (r)existir com ele

Kaunis on rumaa, sanot ja minua paleltaa vaan en lähde mihinkään
Kun avaat ikkunan ja annat tuulen puhaltaa kadulla ei näy ketään jolle huutaa kiitos
Avaat rintani kuin lyhdyn sytytät sinne kynttilöitä liekki on ihmisen elämän muotoinen
Ja kuu valkea käy yli kattojen valaisten meitä ja kuu valkea käy yli kattojen rohkaisten meitä
Niin, pelasta maailma tee se jo tänään tee jotakin mahdotonta
Kaunis on rumaa, tiedän ja helppo on halpaa vaan en voi uskoa sattumaan vaikka tuuli kääntää lehtiä
Sama tuuli kaikkialla ennenkuin kaikki särkyy tämä hämärä muuttuu muistoksi ennenkuin häviää
"Katso kuinka ankarina pilvet kulkee kasvoillani kuinka voisin ihmeen tuoda
Mahdotonta älä pyydä älä pyydä itsellesi."

CMX Rautakantele

(O belo é feio, dizes e eu sinto o frio mas não parto para lado nenhum
Quando abres a janela e deixas o vento soprar, na rua não há ninguém a quem grites:obrigado
E a lua branca atravessa os telhados e faz-nos implorar
Isso Salva o mundo Fá-lo hoje Faz o impossível
O belo é feio, eu sei é fácil é barato mas já não posso acreditar que é por acaso se o vento virar as folhas
O vento é o mesmo em toda a parte antes que tudo se quebre
Este escuro transforma-se em memória antes de se perder)
Tradução necessariamente manhosa feita em guardanapos (que guardo zelosamente) de papel (manchados de cerveja) por uma amiga filandesa de quem tenho saudades
Onde andas Kikke Heikkinen?

27 de maio de 2006

E se de repente alguém percebesse…

que o país e a europa e as américas e quase todo o mundo estão na realidade dominados por extraterrestres que se divertem a entreter-nos com jogos florais para todos os gostos o que ainda fica um pouco dispendioso mas tem que ser até ao dia em que todos gostem só duma coisa
os etês que nos governam andam aí disfarçados
metem-se nas latas de refrigerantes e nas garrafas de cerveja e nos telemóveis e nos carros e nos bancos e depois sentam-nos a ver televisão para que nos levantemos a seguir para ir onde nos querem
não há como escapar
a biblioteca municipal raul brandão tem muito mais sócios que o vitória de guimarães mas foram estes que quase arrasaram a cidade aqui há tempos
portanto
aqui há gato
uma moça que nunca ninguém ouviu falar ganha uma medalha de ouro no salto em comprimento e o que mais se ouviu foi que um jovem acelera ficou em honradíssimo décimo sexto lugar que por acaso era penúltimo
uma desconhecida telma torna-se campeã europeia de judo e poucos saberão o seu apelido contrastando com os vales e santos e quaresmas e moutinhos e lourenços e meireles da equipa da sagres/tmn
ninguém percebe não faz mal e ponham isto na conta de mais uma paranóia minha e já agora acrescentem uma nota em pé de página a dizer que os paranóicos também podem ser perseguidos
agora tenho que ir
mas com um dilema terrível
não sei se vou a o festival da sagres se da superboque
já sei
vou é comer uns caracóis e bebo do que houver

17 de maio de 2006

Menina do mar



Esta menina do mar e de amar faz hoje oito anos
Esta menina do mar é uma prenda

Parabéns
E não te atrapalhes muito no crescer

16 de maio de 2006

És minha

(...)
Vem, serenidade,
e faz que não fiquemos doentes, só de ver
que a beleza não nasce dia a dia na terra.

E reúne os pedaços dos espelhos partidos,
e não cedas demais ao vislumbre de vermos
a nossa idade exacta
outra vez paralela ao percurso dos pássaros.

E dá asas ao peso
da melancolia,
e põe ordem no caos e carne nos espectros,
e ensina aos suicidas a volúpia do baile,
e enfeitiça os dois corpos quando eles se apertarem,
e não apagues nunca o fogo que os consome,
o impulso que os coloca, nus e iluminados,
no topo das montanhas, no extremo dos mastros,
na chaminé do sangue.
(...)
Serenidade és minha. Raul de Carvalho

Às vezes é preciso juntar alguns dias mais mansos para fazer uma verdadeira praia Mesmo sem outro mar que não o da tranquilidade do luar maior Sem outra areia que não aquela que enche as camionetas da memória
E somos riso e faca Veludo e aço Ácido mel Feira e remanso
E o tempo é marcado pelos ponteiros das conversas Pela batimetria dos silêncios
Pelas cores herdadas da Maria Helena Pela carta de Sena e pelo mundo que só é nosso apenas pela obrigação de o salvarmos

Afinal é possível passar ao lado da meta-maternidade da selecção nacional

12 de maio de 2006

Completamente nu no mel

Ou numa banheira de espuma Tanto faz
Olimpicamente há quem nasça já deputante gatinhando sempre em direcção à meca para lamentar Os primeiros grunhidos melismáticos parodiavam já uma célebre marcha estadonovense
. Olivença é nossa
. Olivença é nossa

Outros há que aprenderam de leite a ciência do bisgo e da espera das aves canoras Talvez entoassem aquele refrão que dizia
. Nem mais um soldado prás colónias

Moce Confesso
También xou un iberista dum cabrão Carago

10 de maio de 2006

Só se for café...

Sempre ouvi café é que nos salva e acredito piamente (ou piadamente como se diz na piação das gaivotas).

Bento XVI e Durão Barroso debatem futuro europeu
Durante a audiência, Durão Barroso ofereceu ao Sumo Pontífice uma estátua da Virgem de Fátima em porcelana.

Com tanta loiça que há nas caldas...
Poderia ter oferecido um serviço de café.

9 de maio de 2006

No bico duma gaivota

Por detrás do baile do fato de treino dança uma outra realidade. O cabo de mar deu ordem para limpar todos os ninhos das praias pequenas. Ovos (ouviram?) só nas enseadas vigiadas por banheiros certificados de acordo com a postura do direito marítimo.

O cavalheiro foi cronificado logo após a confissão. Iberista confuso é pecado patrioteiro.
Iberista. O outro é economista e ninguém reclama.

Hoje há chocos com tinta. Tecnológicos só para a semana.
Manuscrítica críptica à sobremesa.
É o regime da dieta ética de patriotismos batidos em castelo.

3 de maio de 2006

O triunfo dos porcos












A Ribeira dos Milagres é a grande metáfora de Portugal
(«este país» como é conhecido cá dentro).
O império da merda governado por suínos que mal se sustêm nas patas traseiras.
Tribunais que brincam à justiça e põem dois murcões a pagar a mesma indeminização um ao outro.
No dia em que se dá mais um golpe na segurança social e se faz mais um assalto aos bolsos dos auto... martirizados abrem telejornais com o scolari.

Uma gaivota voava...